[CRÍTICA] ELIO: UM CHAMADO À CONEXÃO UNIVERSAL, MAS NEM SEMPRE DO JEITO CERTO
- Manu Cárvalho
- 18 de jun.
- 4 min de leitura
LUZ, CÂMERA, CRÍTICA! — Por Manu Cárvalho

Crítica do novo longa da Pixar une coração, saudade e questionamentos existenciais, mas tropeça na própria ambição narrativa
A primeira mensagem para o universo
Elio é um daqueles filmes que chega com o peso do nome Pixar. Desde Toy Story até Soul, a animação da Disney se consagrou como referência em emoções genuínas, roteiros sofisticados e um alcance intergeracional raro. Não à toa, quando o projeto foi anunciado, prometendo ser uma aventura cósmica com um menino latino no centro da trama, muita gente se emocionou antes mesmo de assistir ao primeiro trailer.
Com direção de Adrian Molina (co-diretor de Viva – A Vida é uma Festa) e colaboração de Madeline Sharafian e Domee Shi na produção, Elio estreia nos cinemas em 19 de junho de 2025. A trama, centrada em um garoto solitário que, por acidente, se torna o representante da Terra em um conselho intergaláctico, é carregada de alegorias sobre pertencimento, identidade e... incomunicabilidade. Mas será que a conexão emocional que a Pixar sabe tão bem como construir realmente acontece aqui?

Entre a Terra e as Estrelas
Logo nos primeiros minutos, somos apresentados ao pequeno Elio (voz de Yonas Kibreab), um garoto criativo, introspectivo e cheio de imaginação. Ele vive com sua mãe, Olga (Zoe Saldaña), uma cientista envolvida em pesquisas secretas do governo sobre vida extraterrestre. Enquanto ela tenta manter os pés no chão, Elio vive com a cabeça nas nuvens – ou melhor, nas galáxias.
Em um evento inesperado, Elio é acidentalmente “puxado” por uma tecnologia alienígena e levado para o Consórcio Galáctico, uma espécie de ONU do espaço, onde precisa provar que é digno de representar a humanidade. Mas como fazer isso quando nem mesmo se sente digno no próprio planeta?
A metáfora, embora direta, é poderosa. O menino que se sente estranho no mundo acaba literalmente sendo considerado um alienígena entre os próprios alienígenas. É aqui que a Pixar mais acerta: transformar experiências emocionais universais – solidão, medo de rejeição, busca por identidade – em narrativas fabulosas e sensíveis.
Visual exuberante, mas... exagerado?
Um dos grandes trunfos de Elio é, sem dúvida, seu visual. O design dos planetas, as criaturas bizarras e fascinantes, os efeitos de luzes e atmosferas surreais criam uma ambientação belíssima. A criatividade dos animadores está à flor da pele – há alienígenas que se comunicam por música, outros que mudam de forma conforme o humor, e alguns que não têm corpo físico, apenas energia.
A variedade visual, no entanto, tem um preço: em alguns momentos, o excesso de estímulo prejudica a clareza da narrativa. Diferente de Wall-E, que apostava no silêncio e na contemplação para contar uma história sobre conexão, Elio se perde em sua própria verborragia visual e sonora. A beleza está lá, mas a emoção nem sempre acompanha.

A voz do coração (e dos bastidores)
Yonas Kibreab se sai bem como protagonista. Sua dublagem tem nuances de curiosidade, vulnerabilidade e coragem. Zoe Saldaña também entrega uma mãe forte, mas afetiva, que tenta equilibrar as exigências da ciência com o amor pelo filho. Ainda assim, falta mais tempo de tela para desenvolver melhor essa relação.
Jameela Jamil, que interpreta uma das alienígenas do Conselho, traz um humor ácido bem-vindo, mas que também destoa em certos trechos. A tentativa de criar alívios cômicos é válida, mas nem sempre funciona – e pode cansar um público mais adulto.
Conexão interrompida: o roteiro
O maior problema de Elio está no roteiro. Embora a ideia central seja brilhante, a execução sofre com excesso de didatismo e subtramas mal exploradas. O arco da autodescoberta do garoto é forte, mas poderia ter mais sutileza. Há momentos em que o filme explica demais, e isso quebra o encantamento.
A relação de Elio com a mãe, os dilemas do Conselho Galáctico, a mensagem de paz universal – tudo isso é interessante, mas soa atropelado, como se o filme estivesse com pressa de concluir algo que deveria ser sentido com calma.
Temas grandiosos, tratamento pequeno
É admirável que Elio traga para o centro da narrativa um menino latino, de pele escura, com voz própria e papel de protagonista. A representatividade importa. E aqui ela é tratada com naturalidade e força. A infância não-branca, que tantas vezes foi coadjuvante nas histórias infantis, agora guia a história. Isso merece todos os aplausos.
Contudo, a obra poderia ter explorado melhor a ancestralidade e as raízes culturais do protagonista, que ficam apenas sugeridas. Em tempos de discussões profundas sobre identidade, multiculturalismo e pertencimento, Elio opta por não se aprofundar. E isso limita o impacto da sua mensagem.

Pixar em transição
Vale lembrar que Elio surge em um momento de transição para a Pixar. Após alguns lançamentos mornos e mudanças na estrutura da empresa, o estúdio busca se reconectar com o público. E essa busca é sentida no filme. Há uma ânsia por acertar, por emocionar, por resgatar o brilho de obras como Up, Divertida Mente ou Coco. Mas, infelizmente, essa busca fica evidente demais – e pesa.
Ao final da sessão, o que fica é um misto de encanto e frustração. Encanto pelos temas, pelas imagens, pela proposta. Frustração por perceber que Elio tinha tudo para ser inesquecível, mas tropeça em si mesmo. Como o garoto do título, o filme tenta se provar digno de representar algo maior, mas ainda não encontrou totalmente sua própria voz.
Reflexão final
Se você está em busca de uma animação que fale com o coração, que provoque perguntas sobre quem somos e o que nos conecta uns aos outros, Elio certamente é uma escolha válida. É bonito, é gentil, é bem-intencionado. Só não é memorável como os clássicos da Pixar que nos fizeram chorar sem palavras – apenas com sentimentos.
Nota final: ⭐️⭐️⭐️✨ (3,5/5)
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