top of page

[CRÍTICA] Karate Kid: Lendas – quando o passado encontra o presente, o legado ganha novo fôlego

  • Foto do escritor: Manu Cárvalho
    Manu Cárvalho
  • 9 de mai.
  • 4 min de leitura

LUZ, CÂMERA, CRÍTICA! — Por Manu Cárvalho


Karate Kid: Lendas
'Karatê Kid: Lendas' — Foto: Divulgação

Não é fácil manter viva uma franquia com mais de quatro décadas de história sem cair no saudosismo barato ou na mera repetição de fórmulas. Mas “Karate Kid: Lendas” (2025), dirigido por Jonathan Entwistle, encara esse desafio com coragem e sensibilidade, entregando um capítulo renovado que honra suas raízes enquanto tenta, de forma imperfeita mas sincera, conversar com uma nova geração de espectadores.


Desde o anúncio de que Ralph Macchio e Jackie Chan estariam juntos em um novo longa da franquia Karate Kid, a expectativa dos fãs – antigos e novos – cresceu como um balão prestes a estourar. Afinal, juntar os dois maiores ícones da saga, que até então pertenciam a universos narrativos separados, parecia mais uma jogada publicitária do que uma escolha criativa fundamentada. Porém, surpreendentemente, a união faz sentido. E mais: ela carrega um simbolismo que vai além do fan service. É sobre gerações que se encontram, estilos que se cruzam e mestres que compreendem que ensinar não é repetir técnicas, mas adaptar a filosofia a quem precisa.


A trama acompanha Li Fong, interpretado com sensibilidade por Ben Wang, um jovem talentoso em kung fu que precisa recomeçar a vida nos Estados Unidos ao lado da mãe, depois de uma tragédia familiar. Ele carrega a dor do luto, o peso da adaptação e a frustração de ser um corpo estranho em um ambiente que não o acolhe. O bullying que sofre na nova escola não é apenas físico — é cultural, emocional e silenciosamente devastador. É nesse ponto que o filme mostra sua primeira virtude: ele respeita a dor do protagonista sem transformá-la em um trampolim vazio para a redenção esportiva.


Karate Kid: Lendas
Ralph Macchio, Ben Wang e Jackie Chan em cena de 'Karatê Kid: Lendas' — Foto: Divulgação

Li encontra apoio, aos poucos, em dois mestres muito diferentes entre si: o Sr. Han, vivido com familiar serenidade por Jackie Chan, e Daniel LaRusso, agora mais sóbrio, interpretado com domínio por Ralph Macchio. A química entre os dois veteranos é curiosa. Não há rivalidade nem protagonismo forçado. O filme opta por apresentar seus métodos como complementares — enquanto Han representa a contenção e o equilíbrio do kung fu, Daniel personifica o espírito combativo e emocional do caratê. E nesse entrelaçamento de filosofias, “Karate Kid: Lendas” encontra sua voz.


É um filme de passagens. De ritos. De transições. Não apenas da infância para a maturidade, mas de culturas, estilos e até de modelos narrativos. O roteiro evita ao máximo transformar seus mestres em figuras messiânicas — o que, num universo saturado de treinadores salvadores e senseis imbatíveis, já é uma vitória. Ambos carregam suas cicatrizes, inseguranças e memórias. E é bonito ver como isso transparece em gestos simples: no olhar cansado de Han, nas hesitações de Daniel, no modo como ambos ouvem Li antes de ensiná-lo.


A direção de Jonathan Entwistle é precisa e econômica. Ele não abusa de efeitos ou coreografias mirabolantes. A luta aqui, ao contrário do que se espera de um filme de artes marciais, não é o ápice — é consequência. As cenas de combate são bem filmadas, com destaque para a luta no ginásio escolar e para a sequência final do torneio, mas o que permanece na memória é o que vem antes: os treinos no terraço, os silêncios carregados de tensão, os momentos em que Li aprende mais escutando do que socando.


Karate Kid: Lendas
Cena de 'Karatê Kid: Lendas' — Foto: Divulgação

Há, no entanto, um cuidado estético que vale ser mencionado. A fotografia de Justin Brown sabe brincar com luz e sombra para destacar o contraste entre a solidão do protagonista e a vida que pulsa ao seu redor. A cidade não é mostrada como uma selva opressora, mas como um ambiente que testa e molda. E nesse cenário, a trilha sonora de Dominic Lewis cumpre papel decisivo — ora guiando a emoção, ora se retirando para que a cena respire sozinha.


Se há falhas — e há —, elas não comprometem o todo. O filme por vezes se alonga em diálogos que não avançam a narrativa, e há um certo didatismo em alguns momentos, como se o roteiro temesse que o público mais jovem não fosse capaz de absorver sutilezas. Algumas subtramas, como a do rival de Li, poderiam ter sido mais bem exploradas. O antagonista carece de motivação convincente, e a relação entre ele e Li acaba reduzida a uma lógica de vencedor e perdedor, quando poderia ter ido além.


Mas há honestidade na construção de “Karate Kid: Lendas”. E isso é raro. Trata-se de um filme que não tem vergonha de ser sensível, de olhar nos olhos dos seus personagens, de dizer que força não está nos punhos, mas na capacidade de continuar mesmo quando tudo desmorona. E é isso que o diferencia das dezenas de produções genéricas sobre superação através do esporte que invadem o cinema anualmente.


É impossível não se emocionar em certos momentos — não porque o filme manipula a emoção com artifícios, mas porque ele sabe que há beleza na simplicidade. O reencontro de Daniel com o legado do Sr. Miyagi, por exemplo, é sutil e comovente. Não há flashbacks nem frases de efeito. Apenas um gesto, uma reverência silenciosa. E isso basta.


Karate Kid: Lendas
Ralph Macchio, Ben Wang e Jackie Chan em cena de 'Karatê Kid: Lendas' — Foto: Divulgação

Ben Wang, o novo rosto da franquia, entrega uma atuação cheia de nuances. Seu Li é contido, mas nunca apático. Ele carrega o conflito interno de quem quer lutar, mas não sabe por quê. De quem quer se defender, mas não quer machucar. De quem busca um caminho que não repita os erros do passado. E é isso que o transforma em um herói contemporâneo: não a força do soco, mas a força da escuta.


Karate Kid: Lendas é, em essência, um filme sobre legado. Sobre aquilo que passa de geração em geração, não como receita pronta, mas como gesto, memória e esperança. O final é previsível? Sim. Mas nem por isso menos eficaz. Porque a jornada é que importa. E aqui, ela é feita com respeito, talento e, principalmente, alma.


NOTA: ⭐ ⭐ ⭐ ⭐ (4/5)

Commenti

Valutazione 0 stelle su 5.
Non ci sono ancora valutazioni

Aggiungi una valutazione
bottom of page