Nélio Bilate, voz histórica do rádio policial, morre aos 90 anos no Rio de Janeiro
- Manu Cárvalho
- há 5 dias
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Por Manu Cárvalho

O jornalismo policial brasileiro perdeu uma de suas maiores referências. Nélio Bilate, histórico repórter da Super Rádio Tupi, faleceu na última quarta-feira (2), aos 90 anos, deixando um legado imenso de credibilidade, coragem e compromisso com o ouvinte. A informação foi confirmada por seus familiares, emocionando não apenas colegas de profissão, mas também milhares de ouvintes que acompanharam sua trajetória nas últimas décadas.
Com 46 anos de dedicação à Rádio Tupi, Bilate foi um dos nomes mais emblemáticos da Patrulha da Cidade, tradicional programa policial da emissora. Sua maneira única de contar histórias, ouvir personagens reais e traduzir a violência urbana com humanidade fizeram dele um mestre da escuta e da palavra.
A alma da Patrulha da Cidade
Quem viveu o rádio carioca nas décadas de 1970, 80 ou 90 certamente reconhece o tom grave e direto com que Nélio abria suas participações no programa Patrulha da Cidade. Criado com o objetivo de relatar os acontecimentos mais importantes do dia — com foco em crimes, casos policiais e segurança pública — o programa se tornou líder de audiência e referência no formato.
Bilate não apenas narrava os fatos. Ele ia às ruas, conversava com policiais, familiares, vítimas e testemunhas. Criava uma ponte entre os bastidores da notícia e o coração da população. Era um comunicador nato, alguém que não se escondia atrás do microfone: pisava nos mesmos lugares onde a notícia acontecia.
“A um passo da liberdade” e os ecos da prisão
Outro projeto marcante de sua carreira foi o programa “A um passo da Liberdade”, onde Nélio entrevistava presos diretamente das unidades prisionais. Em um formato inovador e ousado para a época, ele se destacou por sua capacidade de manter o respeito e a empatia mesmo em contextos tensos, ouvindo relatos impactantes, sem sensacionalismo.
Foi nesse contexto que realizou uma de suas entrevistas mais notórias: foi o primeiro repórter a conversar com Guilherme de Pádua, condenado pelo assassinato da atriz Daniela Perez, dentro da prisão. O feito marcou a história do radiojornalismo e ampliou a visibilidade do programa.
Mais que um repórter: um ouvinte da cidade
O diferencial de Bilate sempre foi sua escuta. Ao contrário de muitos comunicadores que se impõem ao microfone, ele preferia ouvir. E era com esse ouvido treinado — atento às dores, detalhes e contradições — que construía suas reportagens. Não à toa, é lembrado por colegas como um homem simples, discreto e profundamente respeitoso com o próximo.
Ele não apenas noticiava crimes, ele os contextualizava. Em um tempo em que o jornalismo popular ainda lutava contra preconceitos e estigmas, Bilate dignificava seu trabalho com ética, sem perder o vínculo com o povo.
Homenagens de quem aprendeu com ele
A morte de Nélio Bilate foi lamentada por diversas personalidades do rádio. Colegas como João Guilherme, da FlaTV, publicaram homenagens emocionadas, relembrando os tempos em que ouviam Bilate no rádio como referência. A própria Super Rádio Tupi emitiu uma nota oficial, reconhecendo o jornalista como “um dos maiores nomes do radiojornalismo do Brasil”.
Nas redes sociais, ouvintes anônimos compartilharam lembranças afetivas, trechos de reportagens e trejeitos do comunicador. Era comum vê-lo caminhando pelas ruas do Rio, de microfone em punho, sem seguranças, sem estrelismo — apenas com sua missão de informar.
O adeus e o legado
O corpo de Nélio Bilate foi velado e sepultado no Cemitério Memorial do Carmo, no bairro do Caju, Zona Norte do Rio, na tarde desta quinta-feira (3). O clima foi de respeito e comoção entre familiares, amigos e profissionais da imprensa que o acompanharam por décadas.
Mas sua ausência física não silencia seu legado. Sua voz segue ecoando nas redações, nos estúdios e nos programas que, direta ou indiretamente, se inspiraram em seu jeito ético de fazer rádio.
Por que Nélio Bilate é inesquecível
Foi pioneiro em dar espaço para as vozes da periferia, da prisão, da rua.
Praticou o jornalismo com coragem, mas também com humildade e escuta ativa.
Transformou a cobertura policial em algo mais próximo da realidade, sem sensacionalismo.
Formou gerações com seu exemplo — sem cursos formais, mas com prática e coração.
Deixou uma marca na história da Super Rádio Tupi, uma das emissoras mais tradicionais do país.
Nélio Bilate parte, mas deixa como herança uma lição simples e poderosa: comunicar é, antes de tudo, escutar. E foi ouvindo o povo que ele fez história. Descanse em paz, mestre do microfone.
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