Após apuração na quarta-feira da última semana (14), a escola de samba Unidos do Viradouro conquista seu terceiro título de campeã do Grupo Especial com enredo sobre serpente mítica.
A história da Vermelha e Branca de Niterói
Fundada em 1946, a Viradouro surgiu das rodas de samba que aconteciam na casa de Nelson dos Santos, conhecido como Jangada. Seu nome se deu porque o local era próximo do ponto de retorno dos bondes da cidade. No ano de 1947, a escola de samba estreou na sua cidade de berço e antiga capital do Estado da Guanabara: Niterói.
Até o ano de 1985, a Unidos do Viradouro desfilou pelo carnaval de Niterói. Nessa época, conquistou 18 títulos de campeã. Após esse período de 39 anos, a escola passou a integrar o desfile carioca por meio de um plebiscito interno, que obteve 98% da aprovação dos componentes para se consolidar.
Já no carnaval carioca, a escola de samba ascendeu gradativamente até se tornar campeã do grupo 1 em 1990 com o enredo “Só vale o escrito”. No entanto, entre os anos de 2010 e 2018, a Viradouro oscilou entre o rebaixamento e o grupo especial, apenas retornando como campeã no ano de 2020. Seus títulos pelo carnaval carioca são:
1997: Trevas! Luz! A Explosão do Universo.
2020: Viradouro de Alma Lavada
2024: Arroboboi, Dangbé
A vitória da grande Vermelha e Branca de Niterói foi arrebatadora nos desfiles do carnaval carioca deste ano. Ao término da apuração, a Viradouro obteve 270 de pontuação, que representam 100% de aproveitamento dos pontos válidos. Dessa maneira, a escola se manteve a 0.7 de distância da vice-campeã Imperatriz Leopoldinense.
Arroboboi: "Salve o Espírito Infinito da Serpente"!
A serpente, enquanto símbolo cultuado na cultura africana, foi protagonista do desfile da niteroiense Unidos do Viradouro e representante da abertura de caminhos para a escola. Com um desfile arrebatador, a escola conquistou o título de campeã do carnaval 2024 do Rio de Janeiro com o enredo "Arroboboi, Dangbé", uma ode à força da mulher negra, à cultura e à religião afro-brasileira.
A temática foi inspirada no livro "Lunário Perpétuo", do escritor afro-brasileiro Jerônimo Cortés, que narra a história de Ahyã, rainha guerreira do Daomé (atual Benin) que se rebelou contra a opressão masculina e se tornou um símbolo de resistência e empoderamento feminino.
Idealizado pelo carnavalesco Tarcísio Zanon, o enredo mergulhou na história do culto à serpente sagrada no reino do Daomé, na África Ocidental. A figura de Arroboboi, a serpente-símbolo da realeza, representou a força feminina ancestral, reverenciada pelas "vodunsi", sacerdotisas guerreiras que protegiam o povo e seus saberes.
Uma jornada de axé e emoção
A bateria "Furacão Vermelho e Branco", comandada por mestre Ciça, deu o tom do desfile com um ritmo contagiante e sincopado, ecoando os tambores do Benin e energizando a Sapucaí. O samba-enredo, composto por Cláudio Russo, Moacyr Luz, Zé Paulo Sierra, Bira do Ponto e Diego Tavares, é uma ode à ancestralidade e à resistência africana, com versos vibrantes como "E a voz do tambor ecoa / No toque do agogô / Arroboboi, Dangbé / É a força que me move / É a fé que me faz vencer".
A força da mulher negra em destaque
O desfile da Viradouro foi marcado pela presença forte e empoderada da mulher negra. As alas representavam as diversas faces da feminilidade afro-brasileira, desde as guerreiras "vodunsi" até as rainhas do Daomé, passando pelas mães de santo e pelas mulheres guerreiras do cotidiano.
Destaque para a comissão de frente, coreografada por Alex Negreiros, que encantou com a performance de uma enorme serpente dourada que se deslizava pela avenida, simbolizando a força ancestral e a sabedoria feminina.
A trajetória de sucesso
O enredo "Arroboboi, Dangbé" foi desenvolvido com pesquisa profunda e respeito à cultura afro-brasileira. O carnavalesco Tarcísio Zanon consultou especialistas em religião afro e visitou o Benin para se aprofundar na história e nos costumes do povo Fon. O resultado foi um desfile grandioso e emocionante, que emocionou o público e os jurados. A Viradouro levou para a Sapucaí um espetáculo de cores, ritmos e alegorias que celebrou a cultura afro-brasileira e a força da mulher negra.
O desfile foi impecável em todos os quesitos. A comissão de frente apresentou uma performance emocionante com guerreiras africanas e a serpente sagrada, símbolo do culto vodum. As alegorias, grandiosas e luxuosas, transportaram o público para o reino de Daomé, com destaque para o carro abre-alas, que representava a serpente Dangbé em uma explosão de cores e movimento.
As fantasias criadas por Rosa Magalhães foram um show à parte. Inspiradas na cultura afro-brasileira, utilizaram cores vibrantes, texturas e adereços que representavam a força da mulher negra, as divindades voduns e a riqueza da cultura africana.
A Viradouro contou com a participação de diversos artistas e personalidades, como a cantora Alcione, que interpretou o samba-enredo na avenida, e a atriz Zezé Motta, que desfilou como destaque em um carro alegórico.
O desfile da Viradouro foi uma verdadeira celebração da cultura afro-brasileira e um grito de empoderamento da mulher negra. A escola mostrou que é possível fazer um carnaval grandioso e luxuoso sem perder de vista a importância da história, da cultura e da ancestralidade.
Um legado para o futuro
A vitória da Viradouro é um marco histórico para o Carnaval carioca. É a primeira vez que uma escola de samba conquista o título com um enredo que celebra a cultura afro-brasileira de forma tão profunda e abrangente.
O desfile contribui para a valorização da história e da cultura africana, para a valorização da mulher negra e para o combate à intolerância religiosa. É um legado que ficará marcado na história do carnaval e na luta por uma sociedade mais justa e igualitária. Com essa vitória, a Viradouro se consolida como uma das maiores escolas de samba do Rio de Janeiro. Essa é a terceira vez que a escola conquista o título de campeã do carnaval carioca. A primeira foi em 1997.
A Vermelha e Branca de Niterói é conhecida por seus desfiles inovadores e criativos, que frequentemente abordam temas sociais e históricos importantes. A escola tem um histórico de compromisso com a cultura afro-brasileira e já apresentou diversos enredos que celebram a história e os costumes do povo negro.
Uma celebração da vida
O desfile foi uma celebração da vida, da cultura e da fé. A escola brindou o público com um espetáculo memorável que ficará para sempre na história do carnaval carioca. A vitória da Viradouro é um símbolo da força da cultura afro-brasileira e da luta por uma sociedade mais justa e igualitária. É um triunfo da alegria, da criatividade e da esperança.
Por Eduarda Rocha com a colaboração de Ana Soáres
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