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Os animais que gritam em silêncio: a batalha contra o monopólio do mercado pet e o risco de um Brasil que abandona

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    Da redação
  • 7 de ago.
  • 5 min de leitura

Como a fusão entre Petz e Cobasi ameaça não só os preços, mas o próprio direito de existir dos animais de estimação mais vulneráveis


Como a fusão entre Petz e Cobasi ameaça não só os preços, mas o próprio direito de existir dos animais de estimação mais vulneráveis

Em um Brasil em que mais de 185 mil cães e gatos são abandonados anualmente — segundo dados da Organização Mundial da Saúde Animal (OIE) —, a notícia de que as duas maiores redes de produtos e serviços para pets podem se tornar uma só empresa parece, no mínimo, cínica. Mas não é ficção. É realidade iminente.

Petz e Cobasi, gigantes do setor, estão prestes a consolidar um monopólio multibilionário, com impactos diretos na vida de milhões de brasileiros e, sobretudo, de seus companheiros de quatro patas. A fusão, em análise pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), é hoje alvo de uma mobilização inédita capitaneada pelo Instituto Caramelo, ONG reconhecida por sua atuação ética e política no bem-estar animal.

Mais de 15 mil pessoas já assinaram o abaixo-assinado público contra a fusão. Nas redes sociais, a campanha #NãoAoMonopólioPet ultrapassou 2 milhões de pessoas alcançadas. E um vídeo comovente — e criativo — estrelado por um “cachorro repórter” e uma “gata âncora” de um fictício telejornal, viralizou ao denunciar, com ironia e inteligência, o absurdo da concentração de mercado.

“Essa mobilização mostra que o cuidado com os animais não pode ser tratado apenas como uma questão de mercado. Mais de 15 mil vozes se levantam para defender a diversidade, a concorrência saudável e a manutenção de uma rede plural de atendimento e acolhimento aos pets e a quem cuida deles”, afirma Marília Lima, responsável técnica do Instituto Caramelo.

Mas por que isso importa tanto?

Do carinho ao capital: como o mercado pet virou campo de batalha

O Brasil é o segundo maior mercado pet do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Segundo o Instituto Pet Brasil, o setor movimentou R$ 68,4 bilhões em 2024. Isso representa não apenas um crescimento econômico expressivo, mas uma mudança no comportamento social: os animais deixaram de ocupar o quintal e passaram a dormir na cama, fazer terapia, consumir alimentação especial, ganhar festa de aniversário e atendimento veterinário digno.

Contudo, essa transformação também atraiu o apetite do capital financeiro. Grupos de investimento, holdings e conglomerados disputam o que antes era um mercado pulverizado e local. Hoje, a tendência é clara: concentração de poder e lucro em poucas mãos.

O que está em jogo com a fusão?

Se aprovada pelo Cade, a união entre Petz e Cobasi criará um supergrupo que dominará mais de 60% do mercado físico e digital de produtos e serviços pet no Brasil. Isso significa:

  • Aumento de preços em itens essenciais, como ração, vacina, vermífugos e consultas veterinárias.

  • Desaparecimento de pequenos negócios — pet shops de bairro, clínicas independentes, cooperativas e abrigos parceiros.

  • Menor diversidade de produtos e serviços, com a imposição de marcas próprias e acordos exclusivos.

  • Precarização do cuidado em regiões periféricas e cidades pequenas, onde a presença dessas redes é quase inexistente.

E, talvez o mais cruel: o abandono em massa de animais por famílias que não conseguirão mais pagar pelo básico.

“Já não dou conta de cuidar deles como antes”

Dona Teresinha, 62 anos, moradora da periferia de São Paulo, cuida de 14 cães e 6 gatos resgatados. Com a ajuda de amigos e do pet shop da comunidade, consegue comprar ração a preço de custo e recebe atendimento veterinário solidário.

“Se fechar esse pet shop e só tiver essas lojas grandes, eu não sei o que vou fazer. Já não dou conta de cuidar deles como antes. Se tudo subir, vou ter que escolher: ou compro remédio pra mim, ou pra eles.”

A fala de Teresinha não é isolada. Ela ecoa em abrigos superlotados, nas ONGs que resgatam, tratam e doam, nas mães solos que dependem da companhia emocional de um bichinho, nas casas de idosos solitários.

Monopólio é abandono: a equação invisível

Não é preciso muito para entender a lógica: quando o mercado deixa de ser competitivo, o preço sobe. Quando o preço sobe, o cuidado cai. Quando o cuidado cai, o abandono aumenta. E quando o abandono aumenta, a violência se naturaliza.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 30 milhões de animais vivem em situação de rua no Brasil. Muitos foram deixados porque adoeceram, envelheceram ou simplesmente ficaram caros demais. E o número pode subir ainda mais com a redução da concorrência e o fechamento dos pequenos players.

Campanha criativa, indignação real

O vídeo lançado pelo Instituto Caramelo assume um tom quase cômico — mas seu conteúdo é cortante. Nele, um cachorro e uma gata narram os riscos do monopólio, interrompendo uma “programação pet” fictícia para convocar o público a assinar o abaixo-assinado.

“A gente já não tem voz. Agora querem tirar o nosso direito de existir?”, questiona o cão âncora, em tom que beira o desespero, ainda que com humor. “Vamos ficar à mercê de um só dono? Não somos mercadoria!”, completa a gata.

A peça foi inteiramente criada com inteligência artificial, uma escolha simbólica: se os animais não podem falar por si, que a tecnologia os amplifique.

A resistência em rede: quem está junto?

A campanha contra a fusão tem gerado uma mobilização transversal e plural, reunindo:

  • Organizações de proteção animal (como Arca Brasil, Ampara Animal e GARRA)

  • Pequenos empreendedores e pet shops locais

  • Influenciadores e criadores de conteúdo do universo pet

  • Veterinários e especialistas em comportamento animal

  • Cidadãos comuns, como eu e você, que entendem que cuidar de um bicho é mais que um ato de afeto — é um ato de responsabilidade coletiva.

A pergunta que o Cade precisa ouvir: quem lucra quando os animais sofrem?

A pauta da fusão não é técnica. É política. É social. É ética. O Cade, órgão responsável por zelar pela livre concorrência no Brasil, tem agora uma missão que extrapola a economia: evitar que o país transforme um vínculo afetivo milenar em um jogo de mercado desumano.

“Não é só sobre cachorros e gatos. É sobre quem tem o direito de cuidar, de amar e de decidir. Um mercado sem escolha é um mercado sem alma”, resume a ativista e veterinária Fernanda Melgaço, que integra a campanha.

Final aberto: o que você vai fazer?

A batalha ainda está em curso. A decisão do Cade sairá nas próximas semanas. Até lá, cada assinatura, cada compartilhamento, cada voz conta.

O link da petição está aberto. A hashtag #NãoAoMonopólioPet segue viva. Os pequenos negócios resistem. Os abrigos lutam.

Mas a pergunta continua:

Quantos animais ainda precisarão ser abandonados para que a gente entenda que amor não pode ser engolido pelo lucro?

Assine. Compartilhe. Questione.

A causa animal é também sua. Porque um país que abandona seus animais é o mesmo que esquece sua humanidade.

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