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Os rios da Amazônia à venda: o decreto silencioso que ameaça a soberania do Brasil

  • Foto do escritor: Ana Soáres
    Ana Soáres
  • 4 de set.
  • 3 min de leitura

Os rios da Amazônia à venda: o decreto silencioso que ameaça a soberania do Brasil
Unsplash

No dia 28 de agosto de 2025, enquanto o país seguia distraído por manchetes sobre o Ministro Alexandre de Moraes, a Lei Magnitsky, o julgamento e a possível prisão do ex-Presidente Jair Bolsonaro, um decreto presidencial foi publicado em silêncio no Diário Oficial. Nele, três dos maiores rios da Amazônia — Madeira, Tocantins e Tapajós — foram incluídos no Programa Nacional de Desestatização. Em outras palavras, abriram-se as portas para a privatização de hidrovias que não são apenas canais de transporte, mas veias pulsantes da vida amazônica.

Os rios na mira da privatização

  • Rio Madeira: conecta Porto Velho (RO) a Itacoatiara (AM), transportando grãos e minérios que abastecem o mundo.

  • Rio Tocantins: rota estratégica que leva a produção agrícola do Centro-Oeste até o porto de Belém (PA).

  • Rio Tapajós: corredor vital para soja e milho, ligando o coração do agronegócio brasileiro a Santarém (PA).

O decreto, no entanto, não esclarece os termos. Será concessão? Privatização direta? Qual será o grau de controle entregue a grandes grupos econômicos, ou mesmo a capitais estrangeiros? O silêncio é, talvez, o dado mais alarmante.

O preço da pressa e da opacidade

Especialistas em direito ambiental e infraestrutura alertam para os riscos. Em entrevista à GloboNews, o economista Sérgio Leitão, diretor do Instituto Escolhas, destacou:

“Entregar rios amazônicos à lógica exclusiva do lucro é comprometer comunidades inteiras que dependem da pesca, do transporte local e da manutenção dos ecossistemas. Privatizar sem debate é retirar a Amazônia das mãos do povo brasileiro.”

A hidrologista Telma Krug, ex-vice-presidente do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas), afirmou à BBC Brasil que:

“A gestão das águas amazônicas precisa ser entendida como questão de soberania, não de negócio. A quem servirão essas hidrovias privatizadas? Certamente não às comunidades ribeirinhas que já enfrentam isolamento e negligência.”

Dados recentes do IBGE revelam que cerca de 30 milhões de brasileiros vivem na região amazônica, dos quais 10 milhões em áreas diretamente ligadas às margens dos rios. Para essas populações, a hidrovia não é infraestrutura de exportação, é caminho para escola, hospital, trabalho e abastecimento.

A memória dos decretos que queimam

Não é a primeira vez que a Amazônia é alvo de negociações silenciosas. Em governos anteriores, tentativas de flexibilizar licenciamento ambiental e permitir mineração em terras indígenas também surgiram sob a sombra de decretos técnicos, sem o devido debate democrático. O resultado foi sempre o mesmo: avanço sobre territórios vulneráveis, retrocesso nos direitos e intensificação dos conflitos fundiários.

O decreto de agosto inscreve-se nessa tradição perigosa de decisões tomadas “de cima para baixo”, sem consulta às populações que mais serão afetadas.

O risco de vender soberania em parcelas

Ao permitir que rios estratégicos sejam geridos por interesses privados — e possivelmente internacionais —, o Brasil abre mão de controlar corredores logísticos que definem sua segurança alimentar, sua economia e sua integridade territorial. Em um contexto global de disputa por recursos naturais e rotas de escoamento, a decisão fragiliza a soberania nacional.

Como alerta a pesquisadora Adriana Ramos, do Instituto Socioambiental, em reportagem ao jornal El País:

“Estamos diante de um processo de internacionalização silenciosa da Amazônia. O discurso é o da eficiência, mas a prática pode ser a entrega do patrimônio nacional a interesses alheios ao Brasil.”

Em tempo

O decreto de 28 de agosto não é apenas uma medida administrativa. É uma escolha política que pode reconfigurar, para sempre, o destino da Amazônia e do Brasil. O que está em jogo não são apenas rios navegáveis: é a soberania nacional, o futuro de milhões de pessoas e a sobrevivência de um bioma essencial ao equilíbrio climático do planeta.

A pergunta que ecoa é simples e urgente: estaremos prontos para permitir que nossas águas sejam transformadas em mercadoria, decididas em gabinetes distantes, sem ouvir o povo que delas depende?

Porque, se os rios da Amazônia são privatizados em silêncio, talvez o próximo passo seja assistir ao país ser vendido, pedaço por pedaço, na mesma penumbra.

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