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Tylenol, autismo e Trump: polêmica sem comprovação científica

  • Foto do escritor: Ana Soáres
    Ana Soáres
  • 23 de set.
  • 3 min de leitura

Tylenol na berlinda: quando a ciência, a política e o medo se encontram


Trump
Reprodução/X

O Tylenol, analgésico onipresente em lares ao redor do mundo, atravessa mais uma crise de imagem. A mais recente envolve a Kenvue — empresa que nasceu em 2023 como um spinoff da Johnson & Johnson — e declarações do presidente Donald Trump, que associou o uso do medicamento durante a gravidez ao autismo. A ligação, é importante ressaltar, não tem comprovação científica. Mas, em tempos de desinformação e algoritmos, bastou um discurso para abalar uma marca de 70 anos e provocar quedas bruscas nas ações da companhia.

Quando a política dita o remédio

Na coletiva em que fez a afirmação, Trump foi categórico: “Se você está grávida, não tome Tylenol.” A frase, dita em tom de alerta médico, acendeu o estopim de uma crise que mistura política, saúde pública e mercado.

Historicamente, a relação entre ciência e poder político sempre foi delicada. Mas neste caso, a equação é ainda mais perigosa: um governante global dissemina uma tese não comprovada que pode levar gestantes a evitar um medicamento crucial para o controle de febres — justamente em um momento em que doenças infecciosas voltam a preocupar.

A reação da Kenvue

A resposta da empresa veio rápida e enfática. “Acreditamos que a ciência independente mostra claramente que o paracetamol não causa autismo”, declarou Melissa Witt, porta-voz da Kenvue. A executiva alertou ainda para o risco de pânico entre mães e pais que dependem do medicamento como primeira linha de cuidado.

O desafio, porém, vai além do comunicado oficial. A Kenvue luta para conter processos judiciais de famílias que relacionam o uso do Tylenol ao diagnóstico de autismo ou TDAH em crianças — ações já rejeitadas por falta de evidências sólidas, mas que seguem em apelação. No mercado, a resposta foi imediata: ações em queda de 17% no mês, um tombo que coloca em xeque a confiança de investidores.

Histórico de crises

Não é a primeira vez que o Tylenol sobrevive a um escândalo. Em 1982, cápsulas adulteradas com cianeto causaram a morte de sete pessoas em Chicago e marcaram a história do marketing de crise. A Johnson & Johnson, então responsável pelo produto, retirou o medicamento das prateleiras, assumiu responsabilidades e criou embalagens invioláveis — um marco regulatório para toda a indústria.

Mas em 2025, a narrativa é outra. Agora, a ameaça vem de dentro do próprio jogo político, onde evidências científicas parecem pesar menos do que manchetes virais.

Ciência sob suspeita

Pesquisadores investigam há anos uma possível ligação entre o uso do paracetamol e o autismo. Até hoje, não há consenso científico que sustente a hipótese. A maioria dos estudos aponta apenas para a necessidade de cautela em altas doses, sobretudo pelo risco de danos ao fígado.

Ainda assim, no tribunal da opinião pública, o que conta é a força da narrativa. E nesse cenário, mulheres grávidas — alvo direto do discurso político — ficam no centro da tempestade: entre o medo de prejudicar seus filhos e a falta de alternativas médicas seguras.

Em tempo

O caso Tylenol expõe algo maior: vivemos em uma era em que a ciência já não basta para tranquilizar a sociedade. A confiança pública, antes sustentada por dados e instituições, agora é frágil, corroída pelo choque entre política e desinformação.

E a pergunta que resta é inevitável: quem está protegendo, de fato, as gestantes e seus filhos — a ciência, a indústria ou a política?

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