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A Arquitetura do Sagrado Feminino

  • Foto do escritor: Aretha Hercovitch Carrão
    Aretha Hercovitch Carrão
  • 2 de ago.
  • 4 min de leitura

O Poder Oculto da Vagina nos Vitrais das Igrejas


"Eles esconderam o divino sob pedra e vitral, mas a vulva nunca deixou de ser o portal."

Durante séculos, nós, mulheres, fomos ensinadas a ver nossos corpos como pecaminosos, nossas vontades como perigosas, e nossa sexualidade como algo a ser escondido — ou, no máximo, tolerado. Enquanto isso, símbolos daquilo que é mais sagrado em nós continuaram estampados em cada catedral, igreja ou templo do mundo ocidental, diante dos nossos olhos. Estavam ali. Sempre estiveram. Mas ninguém nos contou.

O Poder Oculto da Vagina nos Vitrais das Igrejas

Essa matéria nasce como um desdobramento urgente e potente de uma discussão iniciada numa reunião informal de mulheres em estágio avançado de consciência: a vagina como portal espiritual. Hoje, avançamos nessa estrada escancarando uma verdade que incomoda porque liberta: as portas e janelas ogivais das igrejas — sim, aquelas imensas aberturas em forma de arco pontiagudo — são representações simbólicas da vulva.

O formato que conduz ao divino

A forma ogival, muito presente nas catedrais góticas da Idade Média, é esteticamente bela, funcionalmente sólida — e espiritualmente simbólica. É o arquétipo do portal. Em diversas culturas ancestrais, o útero e a vagina são retratados com essa mesma forma pontiaguda e envolvente. Não é coincidência.

Em estudos conduzidos por arqueólogos e antropólogos como Marija Gimbutas e Riane Eisler, há registros de que as formas ovais e ovuladas — o que hoje chamamos de ogivais — eram usadas como representações diretas da vulva nas culturas matriarcais pré-cristãs. Elas não simbolizavam pecado. Pelo contrário: eram reverências ao poder gerador da vida.

Quando o cristianismo se institucionalizou e assumiu como dogma a repressão da sexualidade — especialmente da feminina — esse conhecimento foi estrategicamente encoberto. Mas não apagado. Os vitrais permanecem. As portas continuam sendo abertas por dentro.

O apagamento sutil da sacralidade feminina

A opressão dos corpos femininos sempre foi arquitetada. Literalmente. E arquitetada para parecer outra coisa. Por trás da alegada moralidade dos templos, o que temos são milênios de apropriação de símbolos femininos convertidos em ferramentas de controle.

A sexualidade, longe de ser mero instinto, é energia vital. E segundo as tradições tântricas, indígenas, africanas e gregas, a sexualidade feminina é um caminho direto de expansão espiritual, cura emocional e reconexão com o divino.

Por que isso sempre foi reprimido? Simples: porque é através da sexualidade consciente que a mulher reconstrói sua autonomia. Como alerta a especialista em Sagrado Feminino, sexóloga holística Edmara Otoniel:

“Quanto mais fundo você for em termos de libertação sexual, mais você se expande, logo, mais intuitiva e habilidosa você se torna para perceber falsos esquemas coercitivos — e mais longe você fica da manipulação.”

Do paganismo à manipulação institucional

Não se trata de blasfêmia. Trata-se de memória. O cristianismo, como todas as religiões monoteístas, nasceu imerso em contextos politeístas e profundamente conectados com os ciclos naturais, com o corpo e com a Terra. As sociedades pagãs — celtas, romanas, egípcias, maias — já reverenciavam a vulva como símbolo de fertilidade, vida e transcendência.

A imposição de uma moralidade única e repressora destruiu esses saberes milenares. Mas não os extinguiu. Eles ainda estão vivos nos livros escondidos do Vaticano, nos rituais preservados por religiões afro-brasileiras, nos cantos dos(as) pajés, nas danças das benzedeiras. E também nas pedras frias dos templos que hoje fingem ignorar sua origem.

A vagina como portal de consciência

A vagina, como afirmam culturas antigas e a neurociência contemporânea, é mais do que um órgão biológico. É um centro de percepção sensorial, de memória celular e de poder energético. A repressão que sofremos não é só moral ou simbólica — é neurológica, emocional, espiritual. É uma colonização do corpo e da alma.

Ao nos reconectarmos com a sacralidade da nossa sexualidade, resgatamos algo que sempre foi nosso.

“A única maneira de alcançar a liberdade plena da alma é por meio de uma profunda intimidade consigo, sua vagina é o portal para o nirvana e para a total liberdade que nós, mulheres, tanto buscamos”, defende Otoniel.

E não se trata de erotização. Trata-se de reconhecimento. Reconhecer na nossa anatomia o símbolo máximo da criação. Entender que a porta da igreja e a porta do nosso corpo são, ambas, símbolos de passagem, de entrada, de renascimento.

Por que o sagrado feminino incomoda tanto?

Porque uma mulher conectada com seu corpo é uma mulher que não aceita mais submissões. Porque uma mulher consciente de sua energia vital é uma ameaça aos sistemas de poder que lucram com o nosso medo. Porque uma mulher que vê sua vagina como sagrada é capaz de reescrever a história.

“Se imaginarmos a humanidade inteira com esse conhecimento, a espiritualidade se tornaria incontrolável — e isso seria maravilhoso”, reflete Edmara.

É por isso que o formato ogival das igrejas é metafórico. É por isso que nos ensinaram a temer o que deveria ser celebrado. E é por isso que hoje, aqui, nesta matéria, celebramos.

A retomada de um símbolo roubado

A pergunta que deixo para você, leitora, é direta: E se o que te ensinaram como pecado for, na verdade, a tua salvação?

Sua vagina é mais que corpo. É templo. É passagem. É linguagem esquecida. É arquitetura divina esculpida na pedra — e estampada no céu dos vitrais que nos foram negados.

Olhe novamente para aquela porta da igreja.

Veja além da forma.

E então, atravesse.

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