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CORPOS EM SILÊNCIO, ALMAS EM EXAUSTÃO: O BOOM DA LIMPEZA ENERGÉTICA ENTRE JOVENS BRASILEIROS

  • Foto do escritor: Cigana Carmem
    Cigana Carmem
  • 4 de ago.
  • 5 min de leitura

Uma geração que silencia para escutar o que o mundo insiste em calar.


limpeza energética como ferramenta de cura, proteção e resgate de si
Meditação como prática de limpeza energética

De olhos fechados, sentada no chão frio do quarto, Letícia, 27 anos, respira fundo pela terceira vez. “Minha energia é leve, limpa e fluida”, repete em voz baixa, quase como um mantra secreto. Ela descobriu a meditação de limpeza energética no meio do caos da pandemia, quando o excesso de informações, medos e perdas a deixou emocionalmente entorpecida. “Era como se eu estivesse carregando o peso de coisas que nem eram minhas”, diz. “Hoje, quando sinto esse aperto no peito, sei que é hora de parar tudo, me recolher e limpar.”

Letícia não está sozinha.

Em uma era de hiperconexão, hiperexposição e hiperansiedade, um número crescente de jovens brasileiros tem recorrido à espiritualidade não institucionalizada como forma de autocuidado. Mais especificamente, à prática de limpeza energética como ferramenta de cura, proteção e resgate de si.

Mas por que uma geração supostamente livre, com acesso à informação e a todos os apps de bem-estar, precisa limpar a própria energia com tanta frequência? O que estamos absorvendo – e de quem?

A geração esponja: entre a autocura e o colapso nervoso

Dados do Instituto Ipsos, em parceria com o Fórum Econômico Mundial (2024), mostram que 74% dos brasileiros entre 18 e 34 anos dizem sentir-se ansiosos frequentemente. E mais: 61% relatam ter dificuldade para dormir, enquanto 47% afirmam que a origem de seus desconfortos está mais no emocional do que no físico. Em paralelo, uma pesquisa do Datafolha (2023) revela que cresceu 36% o número de jovens que se identificam como “espiritualizados, mas sem religião”.

Não é coincidência.

“Vivemos numa época em que tudo é vibração. Só que ninguém ensina os jovens a proteger seu campo energético”, explica Marina Bastos, terapeuta integrativa com especialização em psicologia transpessoal. “A meditação de limpeza energética surgiu como uma necessidade: não apenas de silenciar o mundo externo, mas de devolver aos outros o que nunca foi deles carregar.”

Segundo Marina, o Brasil é, hoje, um dos países com maior crescimento na busca por práticas como Reiki, meditação guiada, visualizações e afirmações. Plataformas como YouTube, Spotify e TikTok reúnem milhões de visualizações em vídeos e áudios com títulos como: “Limpeza de energia negativa”, “Descarrego emocional” e “Reequilíbrio espiritual imediato”. Só a hashtag #limpezaenergética ultrapassou 120 milhões de visualizações no TikTok em 2025.

Entre a ciência e o sagrado: o que diz a medicina integrativa

A médica psiquiatra e pesquisadora Dra. Florence Kerr-Corrêa, do Instituto de Medicina Comportamental da USP, não se surpreende com a procura crescente por essas práticas.

“A medicina tradicional começa a reconhecer o impacto das emoções no corpo físico, e vice-versa. Quando o paciente me diz que sente ‘energia pesada’, isso pode ser traduzido em linguagem científica como estresse tóxico, acúmulo de cortisol e queda da imunidade”, diz.

Ela cita um estudo conduzido em parceria com o Ministério da Saúde (2023), que mostrou que a prática regular de meditação promoveu, em até 8 semanas, redução de 35% nos níveis de ansiedade e melhora de 50% na qualidade do sono entre adultos jovens.

“O cérebro não distingue um pensamento negativo de uma ameaça real. O acúmulo emocional, quando não tratado, se transforma em sintoma físico”, explica. “Por isso, quando um jovem decide limpar energeticamente seu corpo e mente, ele está, de forma intuitiva, praticando uma medicina ancestral e atualíssima ao mesmo tempo.”

O ritual da presença: como funciona uma meditação de limpeza energética

Baseado em princípios do xamanismo, da visualização criativa e da bioenergética, o ritual é simples e acessível – mas profundo.

“Primeiro, você silencia. Depois, respira com presença. Então imagina uma luz branca entrando pela sua cabeça, varrendo pensamentos densos, dores antigas, medos não ditos. Tudo é dissolvido e entregue à terra. Depois vêm as afirmações, que reprogramam o campo. É como uma faxina da alma”, ensina Juliana Lemos, facilitadora de meditação em Belo Horizonte.

Ela recomenda que a prática seja feita pelo menos uma vez por semana, de preferência ao amanhecer, ou antes de dormir. “É o momento em que o campo energético está mais receptivo. O importante é fazer com verdade, sem pressa.”

Afirmações como “Eu libero tudo que não me pertence”, “Minha energia é limpa e leve” e “Eu sou equilíbrio” funcionam, segundo ela, como códigos de desbloqueio espiritual.

E a ciência também começa a perceber isso. Uma meta-análise publicada na Frontiers in Psychology (2024) revelou que afirmações positivas têm impacto direto no sistema nervoso parassimpático, ajudando a regular o batimento cardíaco, reduzir a tensão muscular e induzir estados de relaxamento profundo.

O esgotamento invisível: quando o cansaço não é físico

Você já acordou exausto, mesmo depois de dormir por oito horas? Já entrou em um ambiente e sentiu calafrios, dor de cabeça ou irritação súbita? Já sentiu que estava absorvendo a tristeza dos outros sem perceber?

“É o que chamamos de intoxicação energética”, diz Marina Bastos. “Muita gente vive como esponja, sem filtrar o que é seu e o que é do outro. Isso gera adoecimento emocional em larga escala.”

O risco maior, segundo ela, é o acúmulo silencioso de emoções não processadas. “Jovens que não têm espaço para elaborar suas dores acabam internalizando tudo. A meditação de limpeza energética é uma das poucas ferramentas acessíveis que lhes permitem voltar para o corpo, voltar para si.”

O que tudo isso revela sobre nossa sociedade?

Num mundo em que os corpos são explorados, os dados são minerados, os sentimentos são negociados e a atenção é disputada por algoritmos, o simples ato de fechar os olhos e respirar torna-se um gesto revolucionário.

A busca por limpeza energética expõe um mal-estar profundo: estamos contaminados por excesso de tudo — menos de nós mesmos. E isso tem consequências não só individuais, mas sociais. Uma juventude adoecida emocionalmente é uma juventude mais frágil politicamente. É menos crítica, menos criativa, menos coletiva.

“A limpeza energética é um tipo de resistência. Uma maneira de não permitir que o sistema nos roube o essencial”, afirma Juliana. “É como dizer: o mundo está doente, mas eu me recuso a ficar doente com ele.”

Meditar é resistir, cuidar é transformar

A espiritualidade, quando desvinculada do dogma e aliada ao autoconhecimento, tem se mostrado um antídoto potente contra a banalização do sofrimento. A meditação de limpeza energética não é uma moda mística. É uma resposta existencial — e política — de uma geração que se recusa a ser engolida pela toxicidade do tempo.

Enquanto muitos tratam esse movimento como “coisa de esotérico”, ele pode estar sendo, na verdade, um dos sinais mais potentes de que os jovens estão tentando voltar para casa. Para dentro. Para si.

E você?

O que tem deixado entrar em sua energia ultimamente?

O que ainda está carregando que não é seu?

E o que você está esperando para deixar ir?

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