Em 2024, 38 cidades brasileiras não receberam um centavo em emendas parlamentares – e ninguém explicou por que
- Da redação
- 30 de abr.
- 3 min de leitura
Em pleno ano eleitoral, enquanto a maioria dos municípios brasileiros recebeu recursos federais destinados a áreas como saúde, educação e infraestrutura, 38 cidades foram completamente ignoradas pelo Congresso Nacional em 2024. Nenhum centavo em emendas parlamentares — individuais, de bancada ou de relator — foi direcionado a essas localidades, segundo revelou um levantamento da plataforma Central das Emendas. O dado, divulgado ainda no segundo semestre do ano passado, escancarou uma realidade incômoda: quem não faz parte do jogo político, fica fora dele.

Dos 5.570 municípios do país, essas 38 cidades — pequenas e médias, em sua maioria — não receberam qualquer verba extra vinda de Brasília. A ausência de repasses coincidiu com o período mais aquecido da corrida eleitoral municipal, quando prefeitos e candidatos à reeleição geralmente contam com apoio de deputados e senadores para mostrar serviço à população.
SP, MT e MA lideraram o ranking do esquecimento
São Paulo, o estado com maior número de parlamentares no Congresso, teve 11 municípios fora da partilha. Mato Grosso veio logo atrás, com nove cidades. Maranhão somou sete, Minas Gerais seis, Pernambuco duas, e Pará, Goiás e Bahia completaram a lista com uma cidade cada.
Entre os extremos populacionais da lista, estavam Novo Santo Antônio (MT), com pouco mais de 2 mil habitantes, e Ipojuca (PE), com quase 99 mil moradores — esta última, inclusive, um polo industrial e turístico de relevância no Nordeste.
As emendas parlamentares que faltaram — e o silêncio que seguiu
As emendas parlamentares, criadas para fortalecer o pacto federativo e descentralizar investimentos, tornaram-se nos últimos anos uma moeda de troca política. Deputados e senadores direcionam recursos com base em alianças, interesses eleitorais e proximidade com lideranças locais. Quando não há alinhamento político, não há emenda — uma lógica extraoficial que não está na Constituição, mas rege boa parte da relação entre Brasília e os municípios.
Em 2024, esse padrão foi ainda mais evidente. Muitos dos prefeitos que ficaram sem verba federal afirmaram, à época, não ter recebido sequer retorno de seus pedidos enviados a gabinetes. Em entrevista a veículos regionais, gestores relataram que o critério para liberação parecia mais político que técnico. E estavam certos.
O impacto do abandono
Ficar de fora do mapa das emendas significou, na prática, menos ambulâncias, menos asfaltamento, menos apoio à agricultura familiar, menos creches e escolas reformadas. Em cidades com baixa arrecadação própria, a ausência dos repasses deixou sequelas. E, mesmo em municípios economicamente mais fortes, como Ipojuca, o desequilíbrio de investimentos em comparação com vizinhos politicamente bem conectados gerou revolta silenciosa.
A Central das Emendas não identificou nenhum padrão técnico para justificar os cortes. O silêncio dos parlamentares envolvidos também foi um indício de que a ausência de critérios públicos segue sendo a regra do jogo.
Em 2025, o cenário muda?
Já estamos em maio de 2025. Prefeitos eleitos no ano passado assumiram em janeiro, muitos com a missão de renegociar apoios e reconstruir pontes políticas. O Congresso, por sua vez, enfrenta pressão crescente por mais transparência e critérios técnicos na distribuição das emendas — inclusive com propostas que exigem distribuição proporcional e mínima obrigatória a todos os municípios.
Mas enquanto as regras não mudam, 38 cidades brasileiras seguem como exemplo do que acontece quando o jogo político fecha as portas para quem não tem aliados no centro do poder. E a população dessas cidades ainda sente, na prática, a ausência do Estado.
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