A Beleza que o Mercado Machista Tenta Roubar
- Ana Soáres
- 17 de out. de 2024
- 3 min de leitura
O Desafio de Ser Mulher Madura no Século XXI
Recentemente, assisti a um filme que mistura surrealismo e realidade, fui impactada pela jornada da personagem, interpretada brilhantemente por Demi Moore. No longa, A Substância, uma mulher toma uma substância que a transforma em uma versão mais jovem e "perfeita" de si, refletindo um conflito interno que muitas mulheres maduras enfrentam no nosso mundo. O que o filme revela, de forma quase cruel, é a batalha que as mulheres travam diariamente contra o envelhecimento em uma sociedade que idolatra a juventude e rejeita a maturidade.
A personagem, após se desdobrar em duas — a versão jovem, sexy e desejada pelo mercado e a versão madura, com uma carreira sólida, mas que não se encaixa nos padrões vigentes —, nos lembra da pressão implacável que as mulheres enfrentam para se conformar a expectativas irreais. Não é à toa que muitas recorrem a procedimentos estéticos, buscando voltar ao passado, como se a juventude fosse o único estágio da vida digno de ser celebrado. Essa dualidade cruel reflete o que milhares de mulheres experimentam no dia a dia, especialmente quando chegam a um ponto em que a sociedade começa a ignorá-las.

O filme é uma metáfora afiada da realidade que estamos vivendo. A ditadura da beleza jovem, amplificada pelas redes sociais, promove uma cultura que despreza as mulheres maduras. Quantas vezes você já viu comentários depreciativos ou piadas sobre mulheres que, ao atingirem uma certa idade, continuam a viver suas vidas com jovialidade e ambição? São muitas as que se tornam invisíveis para o mercado de trabalho, para as campanhas publicitárias e até mesmo para os círculos sociais.
No Brasil, país com uma história rica de mulheres fortes e pioneiras, essa realidade é ainda mais dolorosa. Desde os anos 2000, a expectativa de vida da mulher brasileira aumentou em quase 10 anos, mas o mercado não acompanha essa mudança. Somos uma sociedade em transformação, com milhares de mulheres que vivem mais e que têm muito a oferecer — seja com sua experiência, seja com seu talento. Ainda assim, as oportunidades e a visibilidade são cada vez menores, conforme os anos passam. Um exemplo revelador são os dados do IBGE de 2022, que mostram que mais de 70% das mulheres com mais de 50 anos acreditam que suas carreiras estagnaram devido à idade.

A pressão para manter a aparência jovem, para ser "desejável" aos olhos de um mercado construído por homens, é avassaladora. Mas o que realmente está em jogo aqui? A luta contra o etarismo não é apenas uma luta por aceitação física; é uma luta política e social, que afeta diretamente as condições de vida, as oportunidades e a dignidade das mulheres maduras. Elas são constantemente bombardeadas com a ideia de que, ao envelhecer, perdem valor. Mas a verdade é que, com o tempo, adquirimos algo muito mais valioso: a sabedoria e a força que só o amadurecimento pode proporcionar.
Ser mulher, hoje, é um ato de resistência. Resistir ao desejo de voltar no tempo e, em vez disso, celebrar quem somos em cada fase da vida. É uma luta para manter nossa autenticidade, enquanto navegamos por um mundo que tenta nos moldar de acordo com seus próprios interesses. E, acima de tudo, é uma luta para garantir que as próximas gerações possam envelhecer sem medo, sem culpa, e com orgulho de suas conquistas.
Na era das redes sociais e da ditadura da imagem, é hora de questionarmos para quem estamos tentando ser "perfeitas". Precisamos nos amar e valorizar nossas cicatrizes, porque elas contam uma história de superação, de vida, de força. E é isso que nos torna verdadeiramente belas: a coragem de continuar, de lutar e de, como tantas mulheres antes de nós, desafiar um sistema que insiste em nos diminuir.
No final das contas, não somos apenas colágeno ou juventude. Somos muito mais do que isso.
Comments